Sunday, September 07, 2008

Carisma


A professora de Língua Portuguesa tinha acabado de me chamar para ir ler o trabalho de casa lá à frente do resto da turma. Estava em pânico, devo dizê-lo, porque o rufião da turma tinha acabado se ser super-elogiado pelo belíssimo trabalho que eu tinha feito sobre poesia e amor e que ele me tinha roubado. Ele que nem sequer sabia escrever o próprio nome sem hesitar várias vezes se havia de escrever Jorge ou Jorje??
Pois é… e o meu pânico ( e se calhar não só) eram precisamente porque o “sacana” do Jorge me tinha roubado o trabalho de casa antes de entrarmos na aula. E mesmo tendo-o lido mal e porcamente (porque ler não era o forte dele) tinha conseguido uma unanimidade de “uaus”, “ais” e suspiros por parte de toda a claque feminina da turma, só porque era o Jorge, era bonito, era atlético, era …enfim um autêntico Deus naquela turma.
O pânico começou a dar lugar a uma certa raiva à medida que ia andando para o lugar ao lado da secretária da professora e quando lá cheguei o vazio que tinha antes na minha cabeça já dera lugar a um monte de ideias díspares e não organizadas de como me vingar de mais uma das “sacanagens” do bacano.
Apesar de estranhar o facto de eu não estar a ler a partir de nenhuma folha, a professora Celeste mandou-me avançar dizendo que começasse por dizer o tema do trabalho.
Escondendo mal a raiva que me enchia comecei.

“Carisma”…
Carisma não é algo muito palpável. Carisma não é algo que se adquira… ou se tem ou não.
Carisma não é algo físico, não é de certeza o facto de ser bonito, elegante ou atlético, que torna alguém carismático.
Samsão não era carismático, era forte e Dalila ao cortar-lhe o cabelo tirou-lhe essa força, o carisma não se rouba desse modo.
O Jim Morrison não era carismático porque era bonito e qualquer mulher cortava um dedo para poder estar com ele, era carismático, porque… raios… porque era carismático.
Porque dizia o que dizia quando dizia … isso sim.
Mas por vezes as pessoas menos atentas confundem as 2 coisas, talvez por isso o mesmo poema dito por 2 diferentes pessoas soe de maneira diferente.
E continuei lendo os versos da canção que tinha escrito para a miúda mais linda do mundo e por quem estava apaixonado há mais de 2 anos e que não me ligava nenhuma porque namorava com o Jorge.

“Esta miúda é mesmo a minha perdição
Eu amo-a do fundo do meu coração
Às vezes ainda passo horas a pensar
O que seria a vida sem ti…mas não consigo imaginar
E cada dia que passa preciso mais e mais de ti
Como o minuto da hora… tu já fazes parte de mim”

A cada palavra que eu dizia, caía uma lágrima dos olhos da Ana que descobria finalmente que o poema que o Jorge lhe tinha mandado no dia em que tinham começado a andar… não era escrito por ele.
E cada palavra minha fazia aumentar o esgar de desespero na cara do Jorge que se começava a ver agora descoberto.
À saída da aula, levei um enxerto de porrada do Jorge, mas valeram-me os tratamentos que (a miúda que eu hoje em dia acho a mais lindo do mundo) a Clara me fez e o modo como a partir daí nos começámos a relacionar e ficar a saber a maravilha que é não ser carismático, mas saber dizer o que se tem para dizer, quando se tem que dizer.

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