Monday, September 30, 2013
A Fotografia
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Estava uma daquelas manhãs que me fazia sentir um mentiroso compulsivo quando cumprimentei o vizinho da frente com um cordial “Bom dia”.
Não havia motivo nenhum para lhe chamar bom, o céu estava farrusco, cinzento mesmo, e a chuva caía com uma intensidade tal que parecia justificar porque é que a água cobre quase 71% da terra e parecia mesmo querer passar a cobrir 72%.
Entrar para o carro com os miúdos era uma aventura diária, mas em dias como este revelava-se uma verdadeira luta pela sobrevivência.
Mas depois de conseguida, tinha o doce sabor da vitória e a recompensa do silêncio a que o temporal os remetia. Não sei se era a falta da luminosidade ou a distracção das linhas da água da chuva nos vidros do carro, mas o que é certo, é que ficavam calados e a viagem até à escola era sempre muito calma.
Nesse dia porém, estourou uma imensa trovoada, e ao primeiro relâmpago ouvi o ruído de fundo no banco de trás aumentar de imediato.
Ao segundo relâmpago ouvi a conversa estalar entre a população do banco de trás. E quando ao terceiro relâmpago dei uma espreitadela rápida para trás (para não me distrair na minha condução), vi algo que não estava preparado para ver.
No banco de trás trazia três seres lindos com o sorriso mais rasgado do mundo e que apesar de parecerem muito tensos, mantinham esse mesmo sorriso a grande custo, denotando no entanto a tensão que a tempestade lhes transmitia.
Já a olhar de novo para o meu caminho, lancei para o ar um pedido de explicações na forma de um
– Porque é que estão tão sorridentes? Qual foi a piada? Porque estão a arreganhar a tacha?
A mais velhinha começou a falar e disse:
- Lembras-te pai, quando há uns tempos eu tive medo dos relâmpagos? Eu disse aos manos a mesma coisa que tu me disseste!
Fazendo um esforço inglório para me recordar de como tinha justificado a existência dos relâmpagos de um modo menos teórico do que ”é o resultado de uma descarga eléctrica entre a nuvem e o solo”, acabei por pedir para contarem o que era então um relâmpago.
Nessa altura foi o mais pequenito que avançou com a explicação que tinha ouvido e absorvido da irmã :
– Então pai, já não te lembras que os relâmpagos são o flash da máquina fotográfica?
A minha pergunta subsequente foi tão rápida que nem tempo tive para relembrar o que pudera ter dito em tempos:
- Então e quem está a tirar as fotografias?
A explicação do mais pequeno veio com a mesma rapidez,
– É Deus, claro! Por isso estamos a sorrir tanto para ficarmos bem na fotografia e tu devias fazer o mesmo papá!
Foi uma das viagens mais divertidas da minha vida. Sorrimos e rimos a bandeiras despregadas e estou plenamente convencido que se Deus estiver mesmo a tirar fotografias não devemos ter ficado nada mal.
O pior são aquelas fotografias em que nos apanha desprevenidos porque não usa flash!!!
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